segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Green Death - Ecoterrorismo Licantrópico vol.0



Organização Ecoterrorista?
Xingú?
Usina Belo Monte?
Mortes e destruição da natureza?
Políticos corruptos?
Uma nova raça de lobisomens?
Para entender tudo isso baixe agora - Green Death - Ecoterrorismo Licantrópico vol.0 - clique na imagem
e leia meu conto
Xingú - Quando as Forças se Unem


ESTE CONTO VOCÊ NÃO VAI ACHAR NADA ENGRAÇADO

Organização de Alfer Medeiros



Autores convidados: Alastair Dias, Amanda Reznor, Carolina Mancini, Celly Monteiro, Diego Alves, Gerson Balione, Ivandro Gore Godoy, Marcelo Augusto Claro, Mariana Albuquerque, Rosana Raven, Susy Ramone e Tânia Souza.

Revisão: Adriana Cabral


http://furialupina.blogspot.com/2011/12/baixe-gratuitamente-o-e-book-green.html

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Amor aos Pedaços

Juscelino e Janilene se conheceram num boteco, a beira da estrada. Eram bóias frias. Ele, dezenove anos, ela, dezessete. Foi amor à primeira vista. A primeira transa foi no meio do canavial. Os dois saíram de lá, arranhados, pelas folhas cortantes da planta. Dois meses depois estavam casados. Viviam os melhores dias de suas vidas. Cinco anos mais tarde, Juscelino apareceu com uma pequenina mancha avermelhada na perna, depois duas e três... Seis meses depois Janilene também apareceu com as manchas.

— Isso deve ser cobreiro. — disse Juscelino.

E para a benzedeira foram.

— Isso não é cobreiro. Não vou mexer nisso. — disse a benzedeira com ar de estranhamento. Já tinha visto muitas manchas vermelhas, mas iguais àquelas, nunca. — Vão procurar um médico. — disse ela.
Para uma benzedeira, mandar procurar um médico, é porque o negócio era sério.
Juscelino ficou furioso. Fazia círculos com caneta esferográfica, em torno das manchas, na tentativa de impedir que se alastrassem. Sem sucesso é claro.
Passado algum tempo as coisas começaram a piorar. Juscelino fazia o aparamento de suas unhas, quando seu dedo mindinho desprendeu-se do pé. Mas sabe como é, pessoa do interiorzão, não quer saber de médico. Colocou fumo no local e pronto. Um dedo a menos não faria falta. Ainda mais o do pé, que não servia nem para cutucar o nariz.

A situação ficou um pouco pior, quando Janilene, depois de colocar o brinco, viu ele cair junto com a orelha dentro da sua xícara de café. Mas o amor entre eles era tudo e não se abalavam com esses pequenos detalhes. O amor compensava estas pequeninas perdas. Qual o problema de ele não ter um dedinho, ela uma orelha e os dois um monte de manchas avermelhadas, que não paravam de se alastrar pelo corpo?
Certa noite, de luar prateado e estrelas brilhantes. O casal estava a fazer amor e em meio a movimentos frenéticos, de vai e vem, o falo de Juscelino desprendeu-se de seu corpo, fazendo aquele som característico de rolha saltando da garrafa, rolando para debaixo da cama. Aquilo acabou com Juscelino, que aos prantos, foi até a mercearia comprar um tubo de cola tudo. Pelo menos foi a única coisa que lhe veio à cabeça. Não queria se tornar um eunuco.

— Olha Jani! Acho que ficou melhor que antes, não ficou não? Só que eu vou ter que ficar com esta fita colante, aqui, até secar. — ele aproveitou e endireitou seu falo, que era meio tortuoso.
Na noite seguinte foram testar para ver se estava tudo bem. E não é que o negócio colou mesmo. Transaram bastante. Sua mulher aprovara cem por cento. Ainda mais que havia endireitado o dito pinto, quero dizer o dito cujo. No frenesi do sobe e desce. No sobe tudo bem. Foi no desce que uma coisa horrível aconteceu. Os peitos de Janilene ficaram nas mãos de Juscelino, que os apalpava com certa força. O desespero tomou conta da moça, que via nas mãos de seu marido, toda a sua feminilidade indo embora. Foi imediatamente consolada por ele, que mostrava a ela um tubo de cola tudo.

— Põem eles um pouquinho mais pra cima! — pediu Janilene ao marido.

— Um pouquinho?

— Tá bom vai, sobe eles, uns vinte e cinco centímetros acima do umbigo.

— Agora sim! Ó, ficou, jóinha, Jóinha, parece de modelo. — disse o agora satisfeito marido.

E foi assim durante muito tempo. Um pedaço caía ali, colava outro aqui. Às vezes passavam o tempo correndo atrás do cachorro de estimação, que insistia em enterrar no jardim, as partes que encontrava pelo chão da casa. O amor foi desgastando-se, desfazendo-se. Já não transavam mais com tanta frequencia. Na última vez que o pinto de Juscelino caiu, não teve como colar, não tinha mais lugar. Guardou num pote grande de palmito depois de uma luta ferrenha com seu cachorro. Um dos peitos de Janilene ficou fora de prumo. Tudo isso começou a minar a paciência do casal, que um certo dia entraram em conflito.

— Olha só... ... eu não aguento mais catar pedaços seus pela casa! Estou cansada! Farta de tudo isso! — esbravejava ela, enquanto pedacinhos de seus lábios, eram lançados no ar, misturados a gotículas de saliva e sangue.

— É? E você! Com esse peito torto... Esse nariz empinado...
— O nariz? Foi culpa sua! Você o colou virado para cima. Agora toda vez me afogo no chuveiro. Seu capado...
— Sua... sua... Seeem buuundaaaa!

Juscelino levantou a mão, com o dedo indicador em riste, e, num movimento brusco, o dedo se soltou. Saiu voando, acertando o olho de Janilene. Aos prantos, ela assoou o nariz e este saiu no lenço. Nervosa chutou com força, no meio das pernas de Juscelino. Seu pé saiu voando junto com o saco e as bolas dele. Nervoso e ensandecido Juscelino pulou, voando pra cima de Jani, mas suas pernas ficaram onde estavam. Somente seu tronco foi pra cima da moça, que gritou. O ato de abrir a boca, para desferir o grito, fez com que seu queixo caísse, deixando um enorme buraco em seu rosto. Rolaram no chão da sala, e foram deixando pedaços de seus corpos, espalhados por todo lugar, até se desfazerem por completo.

Uma semana depois...

— JÚ???... Janiii??????... Porta aberta? Não tem ninguém em casa? Iuhuuuuu!!!!! Tem alguém aqui? Nossa que sujeira é essa? Que cheiro de carniça. Há quanto tempo eu não venho aqui. — a mulher dava pulos por sobre montes do que pareciam ser, carne e ossos. — Deve ter sido você né? Seu cachorro inútil! Deve ter fuçado no lixo, e agora está aí, escondido, embaixo do sofá. — a mulher resmungava enqua
nto recolhia os restos de carne podre e um chumaço embaraçado de cabelos. Jogava-os na lata do lixo. — Onde será que eles foram? Argh!! Você matou algum bicho e trouxe para casa, né? Seu vira latas! — o cachorro roia um fêmur, sem dar atenção ao que a mulher falava.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

O Preço de uma Cagada

Este conto foi baseado em fatos reais vivenciados por um amigo. Alguns elementos foram inseridos ao conto para criar um clima mais tenso.



Boa leitura!




*****




— Pode tirar as calças, deitar de barriga pra cima e abrir as pernas... Nossa! Que assadura feia é essa? Você não usa cueca?
— Uso, mas sabe doutor, é uma longa história...
— Pode contar, você é meu último paciente mesmo.
— Então tá bom: Hoje seria um dia normal, como todos os outros. Acordei, tomei café, me troquei e fui trabalhar. Tive que fazer serviços lá no centro. Peguei o busão e fui. Até aí maravilha. Foi por volta das onze e meia que tudo começo.
Passei em frente a uma lanchonete, daquelas típicas do centro da cidade, suja, freqüentada por personagens estranhos, balconista com as unhas sujas, e salgadinhos que parecem estar na estufa há uma semana, mas mesmo assim, vi uma coisa que há tempos não via, bolovo.
— O senhor sabe o que é um bolovo, não sabe?
— Sim!
— O doutor teria coragem de comer um bolovo, numa lanchonete do centro, suja e mal cheirosa, onde o balconista tinha as unhas pretas de sujeira?
— Não!
— É, mas eu tive, e comi. Tá certo que não era o bolovo original, pois o bolovo original é só o ovo cozido, depois empanado e frito. O da lanchonete era metade de um ovo e carne moída, empanado e frito. Se eu fosse comparar um bolovo com alguma coisa, eu o compararia a uma granada de mão, acho que seria a comparação perfeita. O cara me serviu o bolovo e quando eu vi as unhas dele, franco que sou, falei: — O senhor podia pelo menos limpar estas unhas, não precisava nem cortá-las, mas pelo menos limpá-las.
— Você vai comer minhas unhas? — o balconista perguntou daquele jeito.
— Não! — respondi sem graça.
— E o bolinho você vai comer?
— Vou.
— Então não me encha o saco!
— Peguei o bolovo, sem pratinho mesmo, só no papel, que já estava transparente de tanta gordura e não falei nada. De repente meus olhos foram atraídos diretamente para uma barata que andava sobre o balcão. Eu olhava para ela e para o balconista ao mesmo tempo. Tive a impressão que ela olhava pra mim, querendo dizer alguma coisa, sei lá, do tipo — você tem certeza que vai comer este bolovo? Assustei-me com o murro que o balconista deu na barata sem olhar para ela, em seguida ele sorriu para mim mostrando os dentes. Foi aí que eu percebi que a sujeira não estava só nas unhas do balconista, mesmo assim, mordi o bolovo, só para relembrar os velhos tempos. Enquanto mastigava o pedaço do salgado via o homem limpar, com o pano de prato, os restos sobre o balcão, da agora amassada barata. Senti que o gosto do bolovo estava estranho, mas mesmo assim, dei outra mordida e mais outra. Enquanto mastigava lembrei que minha mãe toda vez reclamava ao meu pai, que a pia estava entupida.
— O bem! A pia entupiu outra vez. — dizia a minha mãe com aquela voz fina e irritante.
Meu pai saía do sofá e vinha reclamando até chegar na cozinha.
— Cacete mulher! Por que você tira esta merda de redinha do ralinho. Por isso que esta porra entope. Tem coca-cola?
— Tem.
— Então despeja no ralo que desentope.
— Bom. Pensei eu enquanto mastigava: Se a coca-cola desentope pia de cozinha, dissolve qualquer coisa no meu estômago. — Ai Brow, me vê uma coca, mas de garrafa de vidro.
— Caralho velho! Tu é fresco hein! Só tenho de lata. Vai querer ou não?
— Dá aí vai. Abri o refrigerante e bebi quase meia lata numa golada só. Puta merda, lembrei que outro dia passou no telejornal que, em hipótese alguma era para se colocar a boca diretamente na latinha de refrigerante, porque a quantidade de bactérias encontrada nela é assustadora. Já tinha ido. Terminei de comer o bolovo e de tomar a coca, pedi a conta.
— Seis paus! — o balconista disse.
Tirei uma nota de cinqüenta e dei para o balconista. Ele retirou o dedo indicador de dentro do ouvido, analisou o conteúdo retirado do interior do orifício auricular, incrível, com a mesma mão que ele usou para me dar o salgado, matar a barata e limpar a sujeira dos dentes e cutucar o ouvido, foi a que ele usou para pegar o dinheiro. Aquilo me embrulhou o estômago. Ele me devolveu o troco, coloquei o dinheiro no bolso da frente. E pensei: O que não mata engorda. E saí.
Tinha que ir até a Rua Líbero Badaró, no prédio da Prefeitura. No caminho algo estranho se moveu dentro da minha barriga. Nossa! Assim tão rápido? Deve ser só deslocamento de ar dentro das tripas. Entrei no prédio, peguei minha senha e fiquei esperando, estava lotado.
Outra vez senti aquele movimento nas entranhas da minha protuberância adiposa e desta vez fez barulho, pois uma senhora olhou pra mim. Apenas disfarcei. Aí veio outro. Sabe quando dá aquela vontade de peidar, só que em vez do peido sair ele volta, implode. Naquela altura do campeonato eu não podia peidar, não tinha confiança nenhuma no meu cu. Vai que em vez de vento vem merda. Achei melhor apertar com força. Veio outra torção. Acho que mais pessoas ouviram o barulho, pois olharam pra mim ao mesmo tempo. Comecei a suar frio e aquele rebuliço na barriga aumentou de intensidade. — Preciso achar um banheiro. As minhas mãos estavam molhadas de suor. Foi a porra do bolovo ou a merda da latinha? Ou os dois juntos? A coca-cola não foi tenho certeza. Não sei, só sei que eu saí procurando um banheiro. Pisei no pé da velha, chutei a bengala de um velho e depois o capacete de um motoboy.
— O campeão? — balançando o corpo para os lados, chamei o segurança que estava na entrada. — Onde tem um banheiro?
— Xiii, velho! O desse andar tá em manutenção, só três andares para cima. O elevador é ali.
— Valeu! Cheguei no elevador, apertei o botão e o cu ao mesmo tempo, quase caguei nas calças, foi por pouco. Acho que meu cu estava querendo armar uma cilada. O elevador não vinha, estava entrando em desespero. Comecei a fazer respiração cachorrinho e o suor escorrendo. Achei que iria funcionar, pois quando a mulher grávida vai dar a luz, em parto normal, funciona, e uma dor de barriga não pode ser pior que uma dor de parto. Será? Acho que é, pois a respiração cachorrinho de nada adiantou. Olhei para o lado e vi a escada de incêndio, estava em manutenção. — Cacete! Decidi, então, cronometrar o tempo entre uma torção intestinal e outra. Exatos um minuto e meio. — Ah! Será que da tempo de achar um banheiro em alguma lanchonete? Eu deveria voltar lá na lanchonete onde eu comi o maldito bolovo e cagar no banheiro dos caras, assim devolveria o bolovo e a coca, mas não daria tempo de chegar até lá. Saí do prédio da Prefeitura e caminhei. Ou errei na cronometragem ou a torção veio antes. Olhei no relógio, 45 segundos, fodeu. Nenhuma lanchonete a vista. A visão já estava ficando turva. — Puta que pariu, pensei, só faltava eu cagar em plena São Bento. Vi a entrada de um edifício, daqueles históricos ou melhor, pré-históricos. Olhei para cima e vi o nome do prédio, Edifício Plenitude. — Ah! Vai ser aqui mesmo. — Entrei, não vi ninguém na portaria, vai ver o porteiro foi ao banheiro dar uma cagada. Olhei para o outro lado e vi a porta que dava acesso à escada de incêndio. Entrei. Cacete e agora, subo ou desço, não sei por que, mas achei melhor descer. Foram três longos lances de escada. E puta merda, acho que nunca ninguém havia chegado ali. O cheiro de mofo era ruim. No meio do caminho outra torção. Não vai dar tempo! Pelo amor, como eu suava. Bem naquele lance a iluminação não funcionava. Tudo escuro. Mais uma torção e aquele barulho nas tripas.
Ah! Vou cagar aqui mesmo! Abaixei as calças e aí venho o dilema. Cago no degrau de cima ou no de baixo. Se cagar de costas para a escada, no degrau de cima, e for mole, vai escorrer e me sujar. Olhei os corrimãos, um de cada lado, vai ser virado para baixo. Segurei com as mãos no corrimão, aí quis inventar né, apoiei as pernas, uma de cada lado do corrimão. Fiquei, mais ou menos, na posição de mulher no ginecologista, com as pernas abertas no suporte. Assim evitaria qualquer possibilidade de me sujar nas próprias fezes. Já pensou se eu escorrego, caio e quebro o pescoço? Meu corpo caído com a cara enfiada na merda e o pescoço quebrado. Imaginei o CSI no caso. O senhor assiste CSI?
— Não dá tempo.
— Assista um dia, o doutor vai ver que legal que é. Enquanto eles vão observando o local dos acontecimentos vão imaginando as possíveis causas da morte. No meu caso a ajudante ia perguntar pro parceiro: — A cagada foi antes ou depois da morte? — Aí ela visualiza a cena mentalmente, eu pendurado no corrimão cagando. — Vou colher uma amostra para identificar a hora da cagada. — Depois ela passa aquele cotonete na merda e coloca dentro do saquinho zip e me vê escorregando e caindo. O barulho do estralo do meu pescoço quebrado encerra a cena. — Segurei com força. E aí então veio, veio que nem uma explosão. Acho que o Big Bang do universo deve ter sido uma bela de uma cagada, será que não?
— Não sei. Por que você acha?
— Ah! Sei lá, porque o mundo tá uma merda, acho que é por isso. Aí veio uma, duas, eu me agarrava ao corrimão com força, três, o suor descia e entrava no meu olho fazendo-o arder..
— Qual olho?
— O que eu enxergo né doutor. ...mas eu não podia limpar, não podia soltar as mãos do corrimão, outra torção, nessa acho que eu gemi, quarta vez. Ufa! Foi como se eu estivesse no espaço, flutuando. Estava aliviado. Um vento gelado bateu no meu cu e comecei a dar risadas...
— Por causa do vento no cu?
— Não, foi porque lembrei do nome do prédio, Edifício Plenitude. Era onde eu me encontrava naquela hora, na plenitude. A sensação era quase que “orgásmica”, Existe está palavra doutor?
— Não, você quis dizer orgástica.
— É, pode ser também. Esperei mais um pouco pra não ser pego de surpresa, torcendo para ninguém aparecer. Seria uma situação constrangedora. Saí da posição com muito cuidado, apesar do escuro, imaginei merda para todos os lados. E aí sim é que me vi em maus lençóis. Vou me limpar com o quê. — Engraçado essas coisas. Estamos com dor de barriga, sabemos que temos que nos limpar após a eliminação do bolo fecal, no meu caso acho que a consistência foi de suco, ou no máximo uma vitamina, e mesmo assim esquecemo-nos de levar algo para a devida limpeza da região. Pensei, vou esfregar a bunda no corrimão. Melhor não, vai que uma rebarba arranha o meu cu. Vai ser na meia então. Não detesto andar sem meia. Então vai ser com a cueca. Limpeza terminada, vesti minha calça e sai deixando para trás, minha cagada fétida e cremosa, junto com a cueca esmerdeada. Ah! Uma curiosidade, não sei se já aconteceu com o senhor, mas o cheiro da cagada era peculiar. Tinha cheiro de borracha. É sério. Outro dia meu sobrinho chegou em casa com uma bola de borracha e o cheiro era igualzinho. Por que será hein?. Para não levantar suspeitas, decidi subir três lances de escada, além do térreo, e descer de elevador. Sai do prédio e agradeci o porteiro, que agora estava lá. Mal sabia ele o que eu acabara de fazer lá na escada. Olhei para cima e li novamente o nome do prédio, Edifício Plenitude, suspirei aliviado e dirigi-me ao ponto de ônibus. — Quando fui pegar a grana, merda! Cadê o dinheiro. Só me faltava essa. Perdi o troco da lanchonete, quarenta e quatro reais. Vai ver, foi na hora que me pendurei no corrimão. Sem grana decidi voltar para casa na caminhada, não tenho cara de pau de pedir dinheiro na rua para os outros... Ué! Por que o senhor está rindo?
— Ah hahahahaha! Você entrou no prédio, cagou na escada de incêndio e depois diz que não tem cara de pau de pedir dinheiro? Ahahahahahaha!.
— Não sei qual é a graça, mas continuando. A pior coisa que existe acho que é usar calça jeans sem cueca. A costura grossa raspa na coxa pelo lado de dentro, perto da virilha e embaixo do saco. Aquilo vai te assando, assando, até ficar em carne viva. E andar do centro até minha casa só podia dar nisso, como o senhor pode verificar.
— Ô? Tá rido de novo por quê?
— Não, sabe que é?... estou fazendo as contas de quanto custou essa cagada.
— Aeee tá me tirando?
— Não! É sério, quer ver só? R$ 6,00 do salgado e o refrigerante... A cueca era nova?
— Mais ou menos, estava esgarçando no fundilho e o elástico estava folgado.
— Uma cueca boa custa R$ 27,00, mais ou menos, no seu caso ela valia uns R$ 10,00, R$ 44,00 que você perdeu, R$ 25,00 da pomada que vou te receitar, R$ 3,00 do pacotinho da gaze. Qual é o seu salário?
— 700, por quê?
— 700 divididos por trinta da 23.333333... dividido por 2, vai dar 11,66666..., vamos arredondar para R$ 12,00, que é meio dia de trabalho perdido. Pa,papapapapa... deu R$ 100,00..... hahahahahaha!
— O que é R$ 100,00?
— O preço da sua cagada hahahahaha. Sua sorte é que aqui é hospital público se não... hahahahaha.


Acho que ela também comeu um bolovo antes da entrevista



Corre procurar uma escada de incêndio...

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Gerson Balione: TRIBUTO VAI LACRAIA

Gerson Balione: TRIBUTO VAI LACRAIA: "Neste Final de Semana! Você não pode perder! Dois Palcos simultâneos! Estoril - SP e Piscinão de Ramos - RJ 'Tribut..."

TRIBUTO VAI LACRAIA




Neste Final de Semana!



Você não pode perder!




Dois Palcos simultâneos!





Estoril - SP e Piscinão de Ramos - RJ









"Tributo Vai Lacraia"




Várias bandas: Restart interpreta Eguinha Pocotó - Fiuk canta Vai Lacraia - Cine interpretando A Lacraia Gostosa. Banda Calypso e Calcinha Preta interpretam Bacanal, ao vivo no palco Piscinão de Ramos. E muitas outras bandas!




Dois Palcos, muita música!


E muito mais!


MC Bengala, MC Franjinha, MC Fodeu, MC Clet, MC Ebola, MC Esfrega, MC Riguela, MC Balena, MC Fão, MC Nusite.




Participação especial de MC Anureto. Você vai Morrer!


E a mais esperada!


A Poposuda! A Rainha do Pancadão!







MC Ririca - A Mulher Alho.









"Tributo Vai Lacraia"


Você não pode perder!


Três da matina! Estoril - SP e Piscinão de Ramos - RJ


A madrugada vai Ferver!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Pinóquistein O Boneco da Ópera





Era uma vez, um carpinteiro fabricante de brinquedos chamado Geppetto. Um dia teve a idéia de criar um boneco, utilizando restos de outros, e de madeira velha. Um braço de um aqui, outro ali, uma perna mais comprida que a outra... Deixou o corpo oco e num pedaço de pinheiro, entalhou um coração, colocando-o dentro dele. Olhou-o deitado sobre a mesa, virou-o de bruços e viu que algo estava faltando. Com seu velho formão fez o último ajuste. Entalhou as nádegas. Para que ficasse o mais natural possível, colocou uma velha e frouxa rodinha, de um carrinho abandonado. Trabalhou dias e noites sem descansar.


— Maravilhoso! — exclamou o velho enquanto ajeitava os óculos no rosto. — Ficou um pouco torto, uma perna menor que a outra, mas ficou bom. — falava consigo mesmo. Cobriu o boneco com um pano e foi descansar.




Era madrugada e uma tempestade começou a cair. Trovões ribombavam. Relâmpagos desciam do céu como lanças. Um deles acertou uma árvore no quintal do velho carpinteiro. A faísca cruzou todo o quintal entrando pela janela, acertando em cheio o peito da mais nova criação de Geppetto. O pano que o cobria incendiou-se queimando uma parte do rosto do boneco.


A Tempestade cessou, e o novo brinquedo tremelicou, uma das pernas chacoalhou e ele acordou. Os olhos se abriram, para o chão desengonçado ele pulou e pela roda frouxa um vento soltou. Sua boca se abriu, ele sorriu e um gosto de cabo de guarda-chuva nela sentiu.


Caminhou todo desajeitado pela sala escura. Tropeçou numa caixa de ferramentas fazendo barulho. Geppetto que estava acordado por causa dos trovões, com o barulho levantou. E, pé, ante pé, até a sala, e com um porrete na mão Caminhou.


— Quem está aí? — perguntou. — Estou armado! Estou avisando!


Estava escuro. Outro relâmpago iluminou a noite, mostrando um vulto, tortuosamente, parado num dos cantos da sala. Geppetto então acendeu seu lampião e não acreditou quando viu sua obra prima em pé, a sua frente. Lágrimas brotaram em seus olhos. Caminhou até ele e viu seu rosto deformado pela queimadura.


— Meu filho! Você está vivo? — o velho então o abraçou, nunca sentira tamanha emoção.


No caminho até o quarto havia prateleiras cheias de bonecos e brinquedos. Um espelho chamou sua atenção. Curioso o boneco parou e viu seu reflexo. Viu o quão torto era e como seu rosto era feio. Não era igual aos que estavam inertes nas prateleiras. Virou-se para Geppetto e com um olhar furioso gritou. Correu desengonçadamente de volta para a sala, viu dependurados na parede uma mascara de pierrô e um casaco, pegou-os e saiu pela noite. Geppetto tentou ir atrás dele, mas sua idade avançada e a tempestade que voltara intensamente o impediram.


Aos prantos O velho Geppetto decidiu apagar o maldito lampião que o fazia lacrimejar.


— Para onde ele foi? Pobre coitado. O que será dele. — lamuriava o velho.


O menino de madeira correu, correu muito, escorregou e rolou barranco abaixo. Foi levado por uma forte enxurrada. Ficou desacordado e atolado na lama por três dias, até que despertou e com muito esforço do barro se desvencilhou. Caminhou mais quatro dias até chegar perto de um lago onde uma garotinha brincava na margem. Ela assustou-se com a figura torta, desequilibrou-se caindo dentro d’água. A pequena gritava por socorro, entre uma golada e outra de água barrenta.


O boneco ao perceber que algo estava errado com a menina, entrou na água para salvá-la, mais por mais que tentasse não conseguia afundar para buscá-la. Viu uma grande pedra na margem, e com cipós, amarrou-a a cintura, mas era tarde demais. A menina estava morta. Populares que ouviram os gritos da menina chegaram no momento em que a criatura saia de dentro do lago, com a menina nos braços. Acharam que o algoz era o lúgubre boneco e tentaram linchá-lo. Não teve outra opção se não fugir mais uma vez. Embrenhou-se na mata e caminhou até chegar a uma cabana, escondendo-se no celeiro, onde adormeceu. Após algumas horas de sono tranquilo, acordou com uma maravilhosa voz, que soava fortemente.


Olhou por uma fresta na parede de tábuas e viu um homem que cantava com voz belíssima, num tenor de arrepiar. Percebeu que o dono da belíssima voz era cego e começou a ajudá-lo nos afazeres domésticos e nas colheitas de batatas. Tudo sem que ele percebesse. Até que um dia sua roda frouxa o traiu.


— Quem está aí? — pergunto o tenor cego.




Caminhou tateando até o celeiro.


— Eu sabia que tinha alguém aqui. É você que vem me ajudando não é?


— Sim! — respondeu o boneco num sustenido sem igual.


— Venha, vamos entrar. Alguém com uma voz tão bela só pode ser bom. Deixe-me ver como você é.


O boneco aproximou-se, deixando que ele tocasse em seu rosto. Logo o homem percebeu que algo estava estranho. Duro como madeira e com o rosto deformado desistiu da idéia, achou melhor não saber como era seu visitante.


Moraram juntos por muito tempo. Tempo suficiente para a criação de Geppetto tornar-se um exímio cantor de óperas. O títere amadeirado estava fora, atrás de provisões para o professor e amigo de canto, quando ladrões apareceram para saquear a cabana e acabaram por encontrar o homem cego.


Torturaram-no até a morte. Quando o boneco chegou, encontrou a porta do casebre aberta e seu mestre caído no chão. Com um corte profundo em sua barriga, que deixava amostra suas tripas, esvaia-se em sangue enquanto sussurrava para seu pupilo.


— É você? Fuja! Não deixem que o vejam... — foram as últimas palavras do homem.


— Ora, ora. O que temos aqui? — perguntou com voz ameaçadora um dos ladrões. — Vamos pegá-lo, Vladinóleo.


— Sim Ladinóleo, deixa comigo.


O ladrão partiu para cima dele e os dois rolaram no chão. Com seu nariz avantajado e pontiagudo, perfurou um dos olhos de Ladinóleo.


— Um boneco de pau, que anda sem cordéis? Só pode ser feitiçaria! — disse Vladinóleo, já o agarrando por trás. — O chefe vai gostar muito disso.


Amarrado, foi jogado junto com as coisas que roubaram da cabana, no fundo da carroça.


— Olha só o que encontramos chefe. — disse Vladinóleo.


— Esta coisa furou meu olho. — resmungou Ladinóleo.


— E o que isso faz? — perguntou o chefe. — Cadê as cordas que o movimentam? — perguntou ele achando que se tratava de uma marionete. — Se isso for brincadeira arrancarei suas línguas.


— Claro que não chefe. Ele está vivo, de verdade. — disse Ladinóleo arrumando o tampão no olho vazado e empurrando o ser desengonçado.


— O que você sabe fazer? — perguntou o chefe. — O que você esconde atrás desta mascara? — puxou-a rudemente. — Ah! — assustou-se! — É melhor você ficar com ela.


O chefe dos ladrões olhou-o de cima a baixo. Viu que uma perna era mais curta que a outra, que os braços eram desiguais, sem falar na deformidade de seu rosto.


— Bem, uma coisa te digo. Só falta uma corcunda para você ficar completo. Todos riram.


— O que você sabe fazer? Anda desembucha?


Ele viu que não teria escapatória e achou melhor cooperar.


— Só sei cantar... — cantarolou ele em lá maior e com uma voz exuberante. — Ópera. — disse ele num tenor estupendo.


Todos se espantaram com a beleza da voz do menino boneco deformado. Naquele instante o chefe dos ladrões viu uma mina de ouro.


Começou a cantar em cabarés, depois passou para teatros pulguentos. A noticia de que existia


um boneco cantor de óperas se espalhou chamando atenção dos entendidos no assunto.


— Precisamos de um nome para ele. — disse o chefe.


— Que tal Pavarotti? — disse Ladinóleo.


— Não! É um nome sem expressão. — respondeu o chefe.


— Plácido! O que acham? — disse Vladinóleo.


— Não combina com ele. — retrucou o chefe. — Já sei, vai ser Pinóquistein O Boneco da Ópera.


Os dois ladrões entreolharam-se. Ladinóleo apenas com um olho. E torceram o nariz.


— Nossa chefe, o senhor é bom mesmo em dar nomes. Haja vista os nossos. — o outro só concordou balançando a cabeça.


E logo cartazes espalharam-se por toda acidade. Extra! Extra! Boneco de Pau Cantor de ópera... Hoje apresentação de Pinóquistein O Boneco da Ópera... Boneco cantor é a mais nova sensação da cidade...




Pinóquistein ficou famoso, mas quem ganhava com isso era a quadrilha de biltres. Vivia em regime de escravidão. Algumas pessoas achavam que ele era uma aberração, fruto de alguma feitiçaria. Sempre apareciam alguns malucos tentando invadir os teatros onde se apresentava. Certa vez ao entrar em seu camarim deparou-se com uma caixa cheia de cupins, sobre a mesa.


A única vez que ganhou alguma coisa foi após uma apresentação perfeita, inesquecível e colossal, onde ele encenou a ópera Pagliacci de Ruggero Leoncavallo. Ganhou uma noite com uma prostituta vestida numa camisola azul, que o forçou a experimentar ópio, e garantiu que o transformaria em homem de verdade.




— É sua primeira vez? — perguntou a moça do baixo meretrício.


— Han? — sob o efeito do alucinógeno não entendera a pergunta.


— Perguntei se é sua primeira vez? — repetiu a rameira de azul.


— Claro que não! — gabou-se mentindo pela primeira vez.




De repente uma coisa estranha aconteceu, seu nariz cresceu. Com a cabeça entre as pernas da mulher começou a ter alucinações, pois viu a vulva dela se abrir e o grelo falar:


— Venha seu boneco de pau, gostoso. Venha para mim.


— Um grelo falante? — gritou ele assustado.


— Diga que eu sou a mulher mais bela do mundo. — pediu a de vida fácil.


— Você é... — exitou. — a mulher mais bela do mundo. — e seu nariz cresceu mais um pouco fazendo a mascara descolar de seu rosto e cair.


Sua face deformada assustou a mulher. Os dois tentaram se levantar, mas zonzos pelo ópio, caíram. A mulher caiu por cima dele e teve seu coração transpassado pelo nariz pontiagudo e grande de Pinóquistein.


Sem a mascara, com o nariz e seu rosto cobertos pelo sangue da meretriz, correu todo tortuoso pelos corredores do prostíbulo, assustando a todos que apareciam para ver o furdunço. Trombou com Ladinóleo e os dois rolaram pela escada abaixo. Ao levantar-se viu suas mãos sujas de sangue. Havia perfurado a jugular do larápio com seu nariz, agora lascado, levando-o a óbito.


— Assassino! — gritou uma prostituta, com seus enormes seios apoiados no guarda corpo da escada.


— Facínora! — gritou um cliente sem roupas com sua genitália a balançar.


Assustado Pinóquistein não teve alternativa se não fugir. Escondeu-se por alguns instantes num monte de feno, mas sua velha e frouxa rodinha, denunciou-o mais uma vez.


— Aqui! Ele está aqui! — gritavam os populares.


— O boneco assassino está aqui! — gritou um cocheiro.


Ele então, decidiu voltar para a casa do seu criador, o velho Geppetto. Um mês de fuga até chegar de onde saiu. O inverno rigoroso castigava a região. Escorraçado, humilhado e perseguido, chegou esbaforido na casa daquele que seria seu ente querido.


— Papaizinhoooo! — Cantarolou num soprano estridente. — Papaizinhoooo! Geppetto lixava desanimadamente algumas peças de madeira, quando escutou os chamados. Seu coração palpitou, a lixa largou e profundamente suspirou.


— É ele! Só pode ser!


O velho foi até a porta e viu o tortuoso boneco, correndo desengonçado em sua direção.




— Meu filho! — disse emocionado o senil Geppetto, abraçando-o. — venha vamos entrar. Está muito frio aqui fora.




Já dentro da casa, Pinóquistein olhou tudo ao seu redor.




— Ouvi histórias a seu respeito. Ficou famoso por cantar ópera. — disse o velho.


— Por que não foi atrás de mim? — perguntou ele num contralto harmonioso. — Por quê? Por que esta perna é mais curta do que esta? — indagava ainda no contralto. — Este braço é diferente deste outro aqui. E meu rosto queimado e desfigurado? Por que esta roda frouxa em meu traseiro? Por quê? Por quê? — e num baixo tenebroso ele cantou. — E alma, eu tenho uma?Geppetto não tinha as respostas para lhe dar.




Murmúrios de pessoas agitadas vinham de fora do casebre. Alguém gritou batendo à porta.




— Abra! Aqui é a polícia. Sabemos que você está aí! — gritou o homem da lei esmurrando a porta com força.


— Papaizinho, esconda-me, por favor. — suplicou Pinóquistein.




Geppetto pensou e lembrou-se da velha lareira. Nunca a usara por ter problemas com a fumaça.




— Rápido esconda-se aqui. Não se mexa e nem faça barulho. — pediu o velho.




Ele colocou alguns restos de madeira, camuflando muito bem Pinóquistein.




— Já vai. Já vou abrir... Calma! Assim o senhor vai derrubara minha porta... Pois não, em que poço ajudá-lo? — perguntou Geppetto.


— Estamos à procura de uma aberração assassina. Vimos ele correndo para esse lado. O senhor notou algo estranho? Uma criatura toda torta, braços disformes...


— Não senhor. — respondeu o velho assoando seu nariz avermelhado.


— Meus homens iram vasculhar as redondezas. O senhor importa-se?


— É claro que não. Fiquem a vontade.


— O senhor poderia me convidar para um conhaque? Está muito frio aqui fora.




Geppetto titubeou, mas acabou deixando o oficial entrar, assim, não levantaria suspeitas.




— Vejo que o senhor é carpinteiro. — deduziu o oficial ao ver as ferramentas e pedaços de madeira sobre a mesa.


— É, fabrico brinquedos. — disse ele sem tirar os olhos do oficial.


— Bem feitos por sinal, mas este falta uma roda. — disse o homem, segurando um carrinho nas mãos. — A propósito quem nós estamos procurando também é feito de madeira. É um assassino cruel. Matou várias pessoas. Muito bom cantor, mas assassino. Deve ser coisa de bruxa. Temos muitas aqui por estas bandas. Tem certeza que o senhor não viu nada? — perguntou o oficial brincando com um bilboquê. — Droga! Nunca acerto isso! O senhor vai ou não vai me servir um conhaque?


— Ah! Sim! Claro! Vou buscar.




Geppetto foi até a cozinha buscar os copos e o conhaque. Demorou um pouco, pois a bebida estava na adega.




— Está fazendo muito frio estes dias. — disse o oficial.




Geppetto não ouviu.




O oficial vasculhava tudo e achou atrás da mesa um recipiente com querosene. Pegou um pouco numa cumbuca e jogou na lareira ateando fogo logo em seguida.




— Não...! — Gritou Geppetto ao ver a lareira em chamas. —...Tenho alergia a fumaça...


— Desculpe, tomei a liberdade de acender sua lareira. Está muito frio.




A madeira seca estalava. Geppetto olhava fixamente para a lareira e via o balanço das chamas.




— Senhor, acabamos as buscas por aqui, Não encontramos nada. — disse outro policial que apareceu na porta.


— Muito bem! Obrigado pelo conhaque. Qual é o nome do senhor mesmo? — perguntou o oficial.


— Geppetto. — respondeu com lágrimas nos olhos.


— O senhor está chorando?


— Não... é apenas a fumaça, ela irrita meus olhos.




O oficial jogou o resto de conhaque que sobrara em seu copo na lareira, fazendo o fogo aumentar de intensidade. Uma pequena e frouxa rodinha, em chamas, veio rolando e parou aos pés do velho e agora tristonho Geppetto.


— É só a fumaça... É só a fumaça... — repetiu ele.


— Muito obrigado. — agradeceu o oficial.




Geppetto acenou sem muita vontade, fechou a porta e se virou para a lareira, fitando-a consternado.


Passaram-se alguns minutos e de repente o velho ouviu:


— Ridi, Pagliaccio, sul tuo amore infranto, ridi del duol che t'avvelena il cor!




Geppetto, sorridente, viu Pinóquistein sair de dentro da lareira, completamente em chamas, cantando o trecho da ópera Pagliacci com um machado na mão. O sorriso do velho transformou-se em pavor e desespero. O velho recuava, incrédulo a cada passo do boneco em sua direção.




— Por quê? Ridi, Pagliaccio, sul tuo amore infranto, ridi del duol che t'avvelena il cor! Este é por uma perna ser mais curta que a outra! — o boneco desferiu um golpe com o machado, acertando a barriga do pobre velho, que se ajoelhou com a dor. — Este é pelos meus braços que são diferentes! — o títere desceu o machado em um dos braços de Geppetto. — Este é por eu não ter alma! — o velho já estava mutilado e ensanguentado, mas ainda vivo. Pinóquistein parou por um segundo, olhou bem nos olhos lacrimejantes do velho e cantou mais uma vez.




— Ridi, Pagliaccio, sul tuo amore infranto, ridi del duol che t'avvelena il cor! E este e mais este, este outro. — Pinóquistein possuído, e em chamas, desferia uma seqüência de golpes com o machado, enquanto pegava fogo. — Toma este, e este, e mais um... — sangue jorrava por todos os lados. — E mais este... — ele levantou o machado acima de sua cabeça. — ...por ter colocado uma rodinha, velha e frouxa em meu traseiro! — e desferiu o último golpe, estraçalhando a cabeça do velho carpinteiro. O boneco em chamas debruçou sobre o corpo dilacerado, incendiando toda a casa.




— Ridi, Pagliaccio, sul tuo amore infranto, ridi del duol che t'avvelena il cor! — Cantou ele, até o último suspiro de sua vida sem alma.




Tradução: Ria Palhaço, ao seu amor quebrado, Ria da dor que envenena seu coração!



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sábado, 16 de abril de 2011

A Lenda do Guerreiro Chinês








Um homem se perdeu no meio da China. Passou três meses dormindo em cavernas e comendo plantas, passando frio e fome. Um belo dia ele avistou no alto de um monte uma enorme casa chinesa. Correu em sua direção e bateu à porta. Abriu-a um senhor chinês de longas barbas brancas que perguntou o que o esfarrapado rapaz desejava. - Estou a mais de três meses perdido pelos campos, dormindo em cavernas frias, comendo plantas. Por favor, eu gostaria de uma cama limpa, um lugar para banhar-me e um prato de comida decente. Estou muito cansado e faminto. O velho chinês ponderou e falou:


- Eu lhe ofereço um quarto limpo, um banheiro, roupas limpas e uma nobre refeição. A única condição é que o senhor não faça nada à minha neta.

- Claro, senhor. O senhor realmente é um homem bom.

- Se acontecer alguma coisa à minha neta, o senhor sofrerá as três piores torturas chinesas.

- O senhor pode ficar tranquilo.

Então o rapaz tomou seu banho, vestiu novas roupas e desceu para jantar. Foi sentar à mesa, olhar para a jovem neta chinesa do velho avô chinês e se apaixonar. Além de maravilhosa, ele sentiu que o interesse era mútuo. Paixão à primeira vista. Pensou em silêncio:

- Há três meses não vejo uma mulher e, com certeza, esta noite valerá qualquer sacrifício, mesmo essas três piores torturas chinesas.


De noite foi ao quarto da jovem e teve a noite mais incrível de sua vida. Ao acordar sentiu um enorme peso sobre o seu peito. Abriu os olhos e viu uma enorme pedra sobre seu peito e nela estava escrito: Primeira Grande Tortura Chinesa - grande pedra sobre peito.

- Bom, se for assim, tudo bem.

Ergueu a pedra e conseguiu lançá-la pela janela próxima à cama, quando ele viu uma linha amarrada à pedra e uma outra frase escrita: Segunda Grande Tortura Chinesa - pedra amarrada ao testículo esquerdo.

Desesperado com a situação o rapaz se jogou pela janela atrás da pedra. Foi quando pode ver escrito uma outra frase: Terceira Grande Tortura Chinesa - testículo direito amarrado ao pé da cama.

Após ter seus testículos arrancados o rapaz foi expulso pelo velho chinês, Shen Pao Su Jin, e seus testículos foram jogados, um de cada lado da grande muralha.


Perambulando, perdido e desanimado, o rapaz, que agora chamava-se, Sha Cuo Mu Shuo, sentia um profundo vazio. Embrenhou-se na selva chinesa. Faminto, perdeu os sentidos e desmaiou.


Um grupo de pandas gigantes o acolheu, mas somente depois que o panda macho, verificou se ele representava algum perigo para suas fêmeas. Foi tratado e alimentado pelos pandas. Aprendeu a comer bambu, mas era tratado como escravo. Às vezes, um grupo de pandas macho, caçoava dele. Paravam bem a sua frente, enquanto ele colhia bambu para sua refeição diária, e mostravam o enorme saco peludo e caiam na gargalhada. Um pequeno panda macho, vendo a tristeza e angustia do rapaz, por não ter os testículos, trouxe-lhe um presente como pedido de desculpas. O rapaz estendeu as mãos e o panda entregou-lhe algo embrulhado em algumas folhas. O rapaz agradeceu e abriu o embrulho, eram dois coquinhos. Podia-se ouvir as gargalhadas dos pandas, ecoando pela mata. O rapaz, desolado, partiu. Voltou até a casa do velho Shen Pao Su Jin, ajoelhou-se pedindo perdão. O velho chinês, então, deu a ele uma missão. Ele teria que procurar e encontrar seus testículos, que haviam sido jogados, um de cada lado da muralha. Trazê-los até ele, que, por meio de uma magia milenar, seriam recolocados no lugar, transformando-os em testículos mágicos. Daria a mão de sua neta Mie Cha Ka Lee Dei, em casamento e desta união nasceria um guerreiro que acabaria com a horda dos vampiros chineses. A horda de vampiros chineses era liderada, nada mais, nada menos, pelo mais temido e sanguinário seguidor de Nosferatu. O vampiro Rei Jing Lee Chu Pei. O guerreio, fruto desta união, iria se chamar: Kong Bi Lao Lan Ka Shang.


O pequeno Bi Lao Lan Ka Shang cresceu e virou o Grande Bi Lao Lan Ka Shang.


O vampiro Rei Jing Lee Chu Pei, ficou sabendo, por intermédio de um morcego mascarado, que usava a cueca por cima do colam e um cinto ridículo, que um guerreiro viria para destruí-lo. Decidiu, então, invocar os espíritos guerreiros de Bruce Lee, Sara Lee, Rita Lee, Calça Lee e Negra Lee.


No dia do grande combate, logo pela manhã, Bi Lao já estava de pé, para ele não existia moleza. De cabeça erguida. Foi para o combate vencendo todos os espíritos guerreiros. Agora seria a batalha final.


Na penumbra da noite, entre uma névoa espessa, pode ver os olhos vermelhos de Jing Lee Chu Pei. Em sua mente passavam-se todos os ensinamentos que seu pai lhe dera. Até a incrível arte de lutar com lanças de bambu, que seu pai aprendera com os pandas gigantes. Após a morte de seu pai, sua mãe, Mie Cha Ka Lee Dei, deu à ele uma boleadeira mágica, feita com os testículos petrificados de seu pai, ela deveria ser usada no combate contra o temido vampiro. O grande Bi Lao estava tomando uma surra de Lee Chu Pei. Caído, lembrou-se da boleadeira, tirou-a do saco, beijou os testículos de seu pai, pedindo forças, girou e arremessou. A boleadeira enrolou-se nas pernas de Lee Chu Pei que foi ao chão. O grande Bi Lao pegou sua lança de bambu e foi direto no peito de Lee Shu Pei. A lança parou na armadura que ele usava, ela não era mágica, mas era feita do hímen retirado de uma tia-avó, que morrera virgem aos 180 anos. Com uma risada gutural o vampiro rei perguntou:


— E agora? O que você vai fazer com este bambu?


Kong Bi Lao Lan Ka Shang, cavalgava no dorso de seu imponente e belo cavalo. A brisa da manhã refrescava-lhe as feridas do intenso combate. Raios de sol brotavam no horizonte. Ao fundo, combalido, via-se Jing Lee Chu Pei, agonizando, com o bambu enfiado em seu traseiro, até quase o último gomo, e vaporizando-se com os primeiros raios de sol.

Provérbio Chinês “O que eu ouço, eu esqueço. O que eu vejo, eu não lembro. O que eu faço, eu não entendo. Estou com Alzheimer”.








Com certeza eles não aprenderam Kung Fu com os pandas gigantes.





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quinta-feira, 14 de abril de 2011

A melhor piada de todos os tempos - por Monty Python - legendado


Monty Python ou The Pythons foram os criadores e intérpretes da série cômica Monty Python's Flying Circus, um programa de televisão britânico que foi ao ar pela primeira vez em 5 de outubro de 1969. Como série televisiva, consistiu de 45 episódios divididos em 4 temporadas. Entretanto o fênomeno Python não se limitou a apenas isso, espalhando-se por shows, filmes, programas de rádio e diversos jogos de computador e livros, além de lançar seus seis integrantes ao estrelato. Sua influência na comédia chegou a ser comparada ao impacto causado na música pelos Beatles. Enquanto no humor britânico sua presença sempre foi nítida, nos Estados Unidos ela é especialmente evidente em programas de conteúdo absurdo como South Park, Adult Swim, trechos de Late Night with Conan O'Brien, além do programa Saturday Night Live. O termo pythonesque, em tradução livre 'pythonesco', está em dicionários da língua inglesa para indiciar algo surreal ou absurdo. O nome Monty Python foi escolhido porque eles o consideraram engraçado. No documentário Live at Aspen, de 1998, o grupo revelou como o nome foi escolhido. Monty veio em tributo a Lord Montgomery, um lendário general britânico da II Guerra Mundial. Python surgiu pois eles decidiram ter uma palavra que também soasse evasiva, e essa pareceu perfeita.



domingo, 10 de abril de 2011

O Olho do Diabo

Shadows City não está em nenhum mapa, mas existe e fica no oeste americano. Próxima ao Texas. Dizem que a cidade foi esquecida por Deus e que o Diabo ao sair correndo, deixou um olho para trás. Cidade que foi muito rica em ouro e que hoje somente moribundos, facínoras, biltres e prostitutas, perambulam por estas terras. Uma maldição assola esta cidade, arrasando ainda mais o que já estava arrasado, Esta maldição trouxera bruxas, dragões e espectros. Espectros esses que vinham de tempos em tempos, ceifar as almas dos pobres moradores que insistam em viver, ou melhor, morrer em Shadows City...


Em algum lugar do Texas 1862




— Segurem este negro! Vocês são uns molengas! — gritava um homem carrancudo que segurava uma pistola, sentado sobre seu cavalo. O negro movimentava-se rapidamente. Dava, giros e gingava como se dançasse. Num salto, pulou por cima dos três pistoleiros que tentavam pegá-lo, usando a sola do pé descalço, chutou, derrubou os três. De cima do cavalo, o cowboy mirou sua pistola no negro dançarino. Deu três tiros e nenhum o acertou. Com outro salto, subiu mais alto que o cavalo, acertando o rosto do homem, com um chute violento, derrubando-o. — O seu moço num levanta não! Num quero matar ocê! — disse o negro num idioma que os cowboys nunca ouviram antes. De repente sentiu uma pancada na cabeça e tudo ficou as escuras.




— Desgraçado! — o homem cuspiu o sangue que saia da boca. — Por que demorou tanto para acertá-lo? Ele deve ser um escravo fugitivo e amaldiçoado. Dei três tiros no safado e nenhum acertou! Ninguém normal pula deste jeito. — reclamava o homem inconformado com a agilidade do rapaz em esquivar-se dos tiros. — Levem-no para o trem. O lugar dele é em Shadows City.


oo


O trem parou num lugar deserto, por volta das onze da manhã. Três homens atiraram o negro de cima do vagão. Estava amarrado. O sol ofuscou a visão do estranho. — Venha seu crioulo. O trem não vai até a cidade que o chefe mandou. — disse o cowboy. — A cidade fica naquela direção... — apontou. —Se é que você vai chegar lá. — disse o outro. O terceiro cuspiu o fumo que mascava, no rosto do rapaz e acertou-lhe um chute na cara, levando-o a nocaute mais uma vez.


oo


Depois de horas o negro acordou com o rosto ardendo pelo sol forte. Com muito custo conseguiu desatar as mãos e pés. Com a boca seca e o corpo dolorido, levantou e começou a caminhar lentamente, na direção apontada...




Nochay colhia ervas, quando avistou alguém caminhando trôpego. Largou tudo e correu para ajudar. O sol castigara o pobre coitado que agora bebia água servida pelo índio, afoitamente. Ao levantá-lo para pô-lo na carroça, viu um colar de contas pretas e vermelhas, que cruzava seu peito e partiu para cidade.


Já estava anoitecendo quando chegaram à cidade. Nochay sabia que não podia ficar na rua àquela hora, era muito perigoso. Principalmente por ser lua cheia. Coisas estranhas aconteciam naquela cidade sombria.


Em casa, acomodou o homem na cama e depois espalhou uma mistura de cinzas com algumas ervas, ao redor das portas e janelas. Disse algumas palavras em apache, colocou um chumaço de algodão, em cada ouvido e acocorou-se ao lado da cama. Esperando que algo muito ruim acontecesse.


As ruas de Shadows City estavam desertas. Sons estranhos ecoavam na escuridão. Uma bruma densa se formou e de dentro dela, espectros trovadores, montados em dragões coloridos surgiram.


O prefeito olhava assustado, pelo canto da janela. Fechou a cortina e correu para o outro cômodo da suntuosa casa. Paul Mc Loophe, é o prefeito mais covarde e ordinário que Shadows City já teve. Feitor de obras faraônicas e superfaturadas, destinou grande parte da verba da prefeitura para construção de uma fortificação no subsolo de sua casa. Este era o quarto mandato dele, não porque era um bom Prefeito, mas porque não existia ninguém para candidatar-se ao cargo. E foi para o subsolo que ele e sua família correram. Cada um tirou do bolso um par de pequenas rolhas, feitas da mais pura cera de abelhas e tamponaram seus ouvidos. Os espectros eram cobertos por mantos negros, de feições horríveis. Cada montaria draconiana era de uma cor. Cinco no total. Foram até o centro da cidade parando no cruzamento principal. O dragão vermelho escuro deu dois passos à frente e o espectro desceu de seu dorso. Parado no centro de um semicírculo o espectro pigarreou...


Numa das casas daquela rua, Roy Rolha de Poço procurava desesperadamente os tampões para seus ouvidos.


— Maldita seja minha avó surda! Onde ela colocou meus tampões! — o gorducho comilão fuçava nas gavetas.


O espectro começou a declamar o poema de sua autoria. Qualquer tímpano desprotegido seria dilacerado levando o corpo a uma desocupação espiritual. — Ah não! Esse outra vez? — resmungou o dragão vermelho claro, que para muitos era cor de rosa.


Os olhos de Roy viraram para dentro de suas órbitas e apenas duas bolas brancas iam de um lado para o outro. Suando e tremelicando, parecia um zumbi.


O espectro caminhava de um lado para o outro, compenetrado no poema que recitava. A mão direita apertava seu peito e a esquerda estendida para frente, demonstrava o quão profundo era o poema, enquanto lágrimas incandescentes, vertiam dos olhos de sua montaria. Para alguns, a dramaticidade da representação era soberba, era o que pensava o otimista dragão amarelo. Para outros, totalmente, descabida e sem jeito, era o que pensava o simplista dragão castanho. O dragão cinza não achava nada, era neutro e muito deprimido. O dragão vermelho claro ou rosa, como alguns gostavam de achar, simpatizava-se com todos, menos com esse poema, esse era um tédio.


Os dragões possuíam uma membrana que tamponava seus ouvidos, quando não agüentavam mais ouvir as ladainhas que os espectros recitavam. Eram poemas chatos, melancólicos, dramáticos, sempre sem sentido algum e muitas vezes repetitivos. Só eles entendiam. E quando faziam jogral, era devastador. De tão ruins que são seus poemas, as almas dos humanos tendem a deixar seus corpos. É nesta hora que os espectros se apoderam delas.


O pobre e roliço Roy, foi caminhando como zumbi até os espectros. A cada trecho do poema, sua alma tentava sair do cilindro carnal. Chegando bem perto dos seres, sua alma apontou fora do corpo mais uma vez e um laço de fogo, jogado por um espectro, agarrou-a pelo pescoço.


Ajoelhado e cabisbaixo o espectro terminou seu recital. O dragão vermelho aguardava em meio a uma poça de lágrimas incandescente. Roy Rolha de Poço, caiu como um saco vazio, estatelando-se no chão.


A bruma densa formou-se novamente e os espectros partiram levando a alma do pobre rapaz.


oo


Nochay deu um pulo quando viu o corpo do forasteiro negro, flutuar na cama e uma luz vermelha em forma de guerreiro, pairar por sobre o homem. Em seguida viu a luz voltar para dentro do corpo. Nunca tinha visto aquilo. Nem mesmo antes de fugir de sua tribo, viu algo parecido nas pajelanças.




oo


O dia amanheceu e o corpo vazio permanecia caído no meio da rua. O coveiro tirava as medidas enquanto aguardava pela perícia que seria feita pelo xerife Tedy Boca Podre. Diz a lenda, que o xerife tem este nome, pelo fato de ter comido um gambá quando criança, outros, que o orifício de seu traseiro foi colocado onde deveria ser a boca. O fato era que ninguém agüentava o mau hálito.


As pessoas aglomeravam-se em torno do corpo caído. De repente uma correria, era o xerife que vinha chegando. As pessoas cobriam suas narinas e bocas com lenços e viravam os rostos, à medida que ele passava. O coveiro aguardava impaciente a chegada da autoridade. Acostumado ao mau cheiro dos corpos, às vezes em decomposição, aguentava ficar na presença de Tedy por no máximo meia hora. O reverendo Merrin apareceu com o nariz tamponado e foi abençoar o corpo somente, pois a alma havia sido levada pelos espectros e seus dragões coloridos.


oo


Nochay abriu as cortinas da casa, que era composta por apenas um cômodo. Banheiro não havia, nem do lado de fora. Apenas um velho penico, que ficava em baixo da cama. E era nele que o índio estava sentado quando o forasteiro acordou. — Onde estou? — perguntou ainda meio sonolento, numa língua estranha. — Como? — Você não fala inglês? — perguntou o índio. — Desculpe. Onde estou? — perguntou agora em inglês. — Em Shadows City. — respondeu Nochay jogando seus dejetos pela janela, diretamente aos porcos que viviam atrás da casa. — Quem é você? — Benedito. — Eu sou Nochay, da tribo Chiricahuas. De onde você é? — Eu sou de Salvador, Bahia. — Não conheço esse lugar. Onde fica? — Brasil.


O índio continuou sem saber onde era. Então Benedito explicou que fugiu do país em um navio que transportava cacau. Aprendera falar inglês trabalhando na construção da ferrovia Bahia and San Francisco Railway. Construída pelos ingleses.


— Estou com fome. Tem algo pra comer? — perguntou o negro.


Nochay serviu um pedaço de carne de porco que ele mesmo criava no fundo da casa. Saciando assim a fome de Benedito. Deu roupas limpas e um par de botas. O índio então contou que era o único médico da cidade. Usava seus conhecimentos indígenas para curar as pessoas. E fazia mais alguns bicos. Queria perguntar sobre o acontecido na noite anterior, mas achou melhor esperar. A recuperação rápida do homem deixou-o intrigado.


— Vamos, vou mostrar-lhe a cidade. — disse o índio.


Caminharam pelas ruas. Todos olhavam o forasteiro. Eram dez da manhã. O Golden Valley Bank já estava funcionando. Passaram pela mercearia Golden Valley, onde se vendiam tampões para ouvidos, feitos com cera de abelhas. Os melhores. Passaram também pela igreja. Uma placa trazia os seguintes dizeres: Golden Valley Church - Nesta Cidade, além de fé você encontra ouro. Mais abaixo uma correção: encontrava ouro. O padre Merrin acenou para Nochay que retribuiu. Mas quando ele olhou para Benedito, um arrepio subiu pela espinha e suas pernas amoleceram. Com um rápido sinal da cruz, entrou correndo para o templo.


— Esta cidade já foi muito rica. — começou a falar Nochay. — O ouro atraiu muita gente pra cá. A história do ouro se espalhou pelo Texas e quadrilhas passaram a saquear a cidade. Até que uma das minas de ouro desabou e soterrou cinco garimpeiros. Toda cidade se mobilizou para o salvamento. Especialistas vieram e tentaram cavar uma outra entrada para a mina, mas ela também desabou, levando junto à ponte da ferrovia. Alguns dias depois, os mineiros soterrados descobriram um túnel que passava por baixo do cemitério, atrás da igreja. Cavaram por dois meses. Acabaram saindo em meio aos túmulos e mausoléus. Era noite de lua cheia. Magros de dar dó, com suas roupas sujas e rasgadas, foram surgindo debaixo da terra. O padre, que cuidava da igreja, achou que eram mortos vivos e chamou o xerife, que matou todos com tiros na cabeça. Tempos depois começou a maldição dos espectros trovadores e seus dragões. O padre foi o primeiro a morrer. Dizem que a cena era muito bizarra. Havia um crucifixo enterrado... Deixa pra lá. Eu ainda não morava aqui, vivia na minha tribo, até me engraçar com Dos-Teh-Seh, filha do Chefe Mangas Coloradas... — Nochay fechou os olhos e começou a imaginar a bela índia. De repente uma flecha fincou no chão, a centímetros do seu pé. O som de gritos o fez sair dos pensamentos.


— Pelos chifres de um búfalo! É melhor a gente correr. — gritou Nochay já correndo. — É o bando de Cochise! Marido de Dos-Teh-Seh! — ele já estava longe.




Quando Benedito se virou, viu uma flecha disparada em sua direção. Deu um salto envergado para direita e a flecha passou rente ao tórax. Ao cair de pé viu um grupo de índios a cavalo e mais três flechas foram disparadas. Com outro salto envergado, agora para esquerda, acertou duas, com um dos pés, partindo-as ao meio e a terceira pegou com uma das mãos. O índio mais adiantado saltou do cavalo ainda em movimento, para cima de Benedito, O negro apoiou-se com o braço esquerdo no chão e com as pernas no ar, acertou o peito do índio, que voou longe. Com uma seqüência de saltos, virou-se na direção dos outros índios, que, fora de suas montarias, corriam ao seu encontro, empunhando machadinhas.


Todos que estavam no saloon de Billy Jackson saíram para ver o que acontecia. De repente a rua estava tomada pelos populares de Shadows City. Todos olhavam o negro desconhecido, dar saltos, piruetas, chutes e bordoadas nos cinco índios. Dois deles desferiam golpes, simultâneos, com suas machadinhas e Benedito esquivava-se impressionantemente.


— Só vi um cara dar pulos assim. — comentou um cowboy. — Como era mesmo o nome do cara... Grilo... Besouro... — tentava se lembrar. — Gafanhoto! Isso mesmo... Era gafanhoto.


— Ah! Aquele que foi encontrado morto, enforcado, no prostíbulo? — Lembrou um outro. — Mas aquilo era Kung Fu. Isso não parece ser Kung Fu. — falou o homem.


Com os cinco índios caídos, Nochay apareceu saído de trás de uma carroça estacionada.


— E não voltem mais aqui! Seus covardes! — gritava Nochay para eles, que agora fugiam em suas montarias. — Você é bom mesmo! Que tipo de luta é esta? — perguntou o índio.


— Capoeira. — respondeu.


— Hum! O que significa este colar? — perguntou Nochay. — Isto é uma guia. Uma ligação direta com meu Orixá. — explicou. — E quem é esse Orixá? — Ele me protege, me ajuda. É Exú. — Um espírito. — concluiu Nochay.




Várias pessoas chegaram para ver o forasteiro de perto. De repente a multidão dispersou-se, abrindo caminho e tampando suas narinas. Era alarme falso. Quem vinha passando era Bob o catador de estrume em sua carroça cheia. Todos suspiraram aliviados, por pouco tempo. Logo atrás da carroça, vinha o xerife.


— Rápido, ponha isso no seu nariz. — Nochay deu um chumaço de algodão para Benedito tamponar suas narinas.


— Ora, ora! Até que enfim alguém bom de briga. Aqui nesta cidade só têm maricas. — o xerife falava e as pessoas viravam o rosto. Uma mulher, que estava ao lado do xerife, tampava seu nariz com duas bolotas de estrumes recolhidas do chão. — Não é mesmo Nochay? Quem é seu amigo?


— O nome dele é Benedito. Encontrei-o quase morto lá na planície. — respondeu o índio.


— Para quem estava quase morto, o senhor está bem vivo, não é mesmo? — duvidou o xerife, olhando-o bem de perto. — Se você for escravo fugitivo, terei que devolvê-lo ao seu dono. Mas enquanto isso... — Tedy viu no rapaz, uma forma de lidar com os problemas da cidade. — Vamos comemorar a vitória sobre os índios, no Saloon de Billy Jackson. — e deu um longo abraço em Benedito que já começava a passar mal.


Dentro do saloon a música rolava solta. Billy servia um drink ao xerife, a base de licor de menta, wihsky e muita hortelã. As irmãs, Glória e Gaynor, empolgavam a todos com suas maravilhosas vozes. Ray, tocava o velho piano sem olhar. Numa mesa, bem no canto do recinto, estavam Nochay e Benedito. Muitos já estavam embriagados. Justamente dois destes, os falsários, irmãos Vanili, chegaram na mesa onde estavam os dois.


— Hei! — gritou um dos homens com uma pistola apontada para ele. — Você chegou agora e já quer bancar o herói? — o homem gritava, cuspia e dava goladas numa garrafa de wihsky.


A música parou e o ar pesou. Não, dessa vez não era o Xerife Tedy.


— Ei! — gritou o outro. — Estamos falando com você!




Benedito agora de pé encarava o homem armado.


— Adeus crioulo! — gritou o cowboy disparando três vezes.


Todos olharam com estranheza, pois a arma falhara nas três tentativas. Os irmãos Vanili ficaram constrangidos, pois nunca a pistola de um Vanili falhara. A única vez que passaram por um constrangimento destes na vida, foi quando tentaram a carreira de cantores num saloon em Laredo. Benedito fitava os dois com um olhar estranho. Nochay escondia-se debaixo da mesa. O homem que atirou primeiro, inconformado, abriu o tambor e conferiu as balas. Estava tudo certo. Apontou para um bêbado encostado no balcão e atirou. O susto foi geral. O bêbado caiu com sua cabeça estourada. O segundo homem também sacou sua pistola e disparou, sem sucesso. Apontando para o alto o homem disparou, acertando o candelabro e arrebentando a corrente que o segurava. A queda acertou uma mesa onde alguns cowboys jogavam carteado. Iniciou-se uma grande confusão. Pancadaria geral. Ray escorregou seus dedos pelo teclado do velho piano e uma canção dava fundo musical para o quebra, quebra.


— Adoro isso! — gritou o pianista enquanto se abaixava para dar passagem a uma garrafa de whisky que vinha voando.


Benedito esquivava-se e dava golpes de capoeira. Nochay rastejava por debaixo das mesas procurando uma saída.


Empolgados com a confusão, não perceberam a noite que chegava. Até que o xerife apareceu na porta do saloon dando dois disparos para o alto.


— Vocês estão loucos? — gritou ele. — Já está anoitecendo e os espectros vão chegar. Todos para suas casas.


Todos que estavam dentro do saloon esperavam que o xerife Tedy desse passagem, mas ele apenas ficou esperando. Desesperados, todos correram e pularam, arrebentando as janelas laterais do saloon.


— Você também, Ray.


— Depois do Senhor. Vou afinar meu piano. — disse ele com a cabeça enfiada dentro do instrumento tentando fugir no mau cheiro.


Após toda a correria as ruas ficaram desertas e Benedito se viu só. O vento soprou e um arbusto seco passou rolando.


A bruma densa apareceu e de dentro dela os espectros vestidos de mariachis surgiram montados em seus dragões coloridos. A noite seria longa. Os espíritos desceram de suas montarias draconianas e ajeitaram-se em seus lugares, ajeitaram seus sombreiros. Os dragões posicionaram-se, cada um atrás de seu espectro. O primeiro espectro o do dragão amarelo, soprou o trompete. O som saiu num floreio magnífico e seu dragão cuspiu uma labareda alaranjada, pegando os outros desprevenidos. O espectro do dragão cinza desdenhou. Num dedilhado incrível, no seu violão de cinco cordas, o espectro do escamoso castanho que agora estava acaju, deu um pulinho, batendo os calcanhares em sincronia com o dedilhado. O Espectro do vermelho escuro cumprimentou o amigo pela destreza no dedilhado e deu continuidade no acompanhamento com o seu violão. O espectro do cinza desdenhou mais uma vez, e seu dragão cuspiu uma fagulha no chão. O espectro do dragão vermelho claro, que alguns chamavam de rosa, tocou seu violino. Todos agora olhavam para o espectro do dragão cinza. Ele deu de ombros, e começou a balançar dois chocalhos. Até que estava no ritmo da música. Mas na hora que suas vozes ecoaram noite adentro foi um martírio. Desta vez somente tampões feitos de cera de abelhas dariam conta da desgraça sonora.


Benedito foi tocado pela voz horrenda dos espectros e seguiu em direção à encruzilhada. Ao chegar próximo de onde estavam, parou. Seu corpo e sua alma entraram em intenso embate. Uma luz vermelha saiu de seu peito e tomou forma de enorme guerreiro negro, portador de uma espada de luz. Benedito abriu os olhos e sorriu para os espectros, correndo em seguida. Assustados com o fato inusitado, os espectros continuaram a cantar. O vermelho claro assumiu a cor rosa e correu, largando seu espectro. O dragão amarelo cutucou com sua pata, o espectro à sua frente, que não deu bola. O do dragão cinza atirou um dos chocalhos na cabeça de outro, que se virou nervoso. Ao se deparar com o guerreiro se posicionou para combate, chamando os outros.


O guerreiro que pairava no ar, envolto numa luz vermelha, desceu com uma força incrível, afundando a terra onde pousou. Toda cidade estava em transe. Ou pelo menos quase toda.


Nochay viu quando Benedito correu na direção da igreja. Certificou-se de que ninguém o olhava. Curiosamente não viu o xerife nem o padre Merrin. Era hora de sair dali.Todos os outros andavam como zumbis. De fininha foi desvencilhando-se de todos. Foi até sua casa, pegou a carroça rumando para a igreja.


Padre Merrin rezava ajoelhado, em frente à porta de acesso à escadaria que levava até a mina, embaixo do cemitério. Nos fundos da igreja.


Salvador - Brasil, dias antes de Benedito embarcar.


Atabaques soavam num ritmo frenético. Um homem negro, com um turbante e vestido de branco, cheio de penduricalhos, girava de um lado para o outro. Balançava o corpo, dando baforadas num charuto e goladas numa garrafa de cachaça. Parecia estar em transe. Benedito estava nu, ajoelhado e embebido em sangue de cabra. Os atabaques pararam e o homem que dançava, falou com voz estranha:


— Ó mizinfim, suncê tem agora o corpo fechado. — disse o pai de santo, dando tragadas no charuto e soltando a fumaça em volta de Benedito. — mizinfim vai pega embarcação que leva cacau pros estrangeiro... Os Orixá vão pô suncê no caminho... Vai até a cidade que os homi munta cavalo, dá tiros pro arto e fala ingreis. Suncê vai sofrê, mais num vai morrê. — os olhos do homem estavam virados e ele dava trancos com o corpo. — Um filho da terra vai te ajudá, outros não vão gostá... Atrais da casa do Senho, suncê vai encontra um buraco, bem na morada dos morto. Cuidado com quem cuida da casa do Senho... Cinco espírito vão querê sua alma. Mas Exú vai te guarda.... Não escuta suas canturias... E no fundo do buraco, em baixo da casa do Senho, muito oro vai encontrá... mais o mais importante è preda vermeia. O zóio do Diabo. Muitos poder ela vai te dá e a liberdade pra nóis suncê vai trazê...


Benedito, de olhos fechados, levantou. Uma mulher trouxe-lhe um colar de contas vermelhas e pretas e colocou-o, cruzando seu peito, deslizava suas mãos pelo corpo besuntado em sangue, balbuciando palavras incompreensíveis...




oo


— Olá seu padre. — disse Benedito em português. — Ocê que chama os espectros não é? O padre Merrin assustou-se com a voz. Olhou para trás e viu Benedito. Aquele frio na espinha o deixou amedrontado. Sentia que o negro tinha ligação com algo ruim. Segurou o terço com força, apertando-o contra o peito.




— Você veio atrás da pedra, não é? — perguntou o padre.


O olhar diabólico do negro respondia a pergunta.


Com um golpe violento, girando no ar feito parafuso, acertou o padre na cabeça. O golpe quebrou o pescoço, fazendo a cabeça do padre girar até ficar ao contrário, pondo fim à vida do pontifício. Uma onda azulada saída do terço que o padre segurava, percorreu toda a sala, derrubando a proteção espiritual que existia no local. Arrombou a porta que dava acesso à escadaria e desceu até a mina. Chegou a uma antessala repleta de enormes pepitas de ouro. No fundo da sala estava a pedra vermelha.


No cruzamento principal da cidade os espectros e seus dragões, travavam uma batalha ferrenha com o guerreiro de luz. Jogavam seus laços incandescentes. Mas, golpes de espada os cortavam ao meio. Bolas de fogo cuspidas pelos dragões explodiam, uma atrás da outra, no peito do Orixá protetor.


Nochay ao chegar na igreja, encontrou a porta aberta. A avó do finado Roy estava sentada no último banco, a rezar. A velha surda nem notara sua presença. Nochay achou estranho. Caminhou cuidadosamente até o fundo do templo. O corpo do padre Merrin estava caído no chão com o pescoço torcido. Achou outra porta aberta e desceu as escadas, até chegar a antessala.


Benedito contemplava a pedra vermelha. O Olho do Diabo. Sentiu que não estava sozinho, ao virar-se deparou com Nochay que disparou três flechas de uma só vez. Benedito pulou e girou no ar, acertou duas flechas, mas a terceira penetrou em sua coxa esquerda proporcionando uma dor lancinante. Olhou assustado o sangue que escorria. Benedito quebrou a flecha e correu de encontro ao índio que atirou mais duas. Essas acertaram o peito do negro.


— Não, isso não pode acontecer! Eu tenho o corpo fechado. — disse Benedito em inglês, enquanto regurgitava sangue.


— Você deixou seu espírito protetor lá, lutando com os espectros, se esqueceu? — retrucou Nochay.


— Mas... eu matei quem cuidava da igreja! — disse entre uma suspirada e outra.


— Quem, o padre? Você está enganado. Sou eu quem cuida da igreja. Eu limpo o chão, arrumo os bancos, tiro o pó do altar. Eu lavava até a roupa do padre. Aquele miserável... — Nochay preparava mais uma flecha. — Trabalhando aqui descobri sobre o Olho do Diabo e o ouro. Quando vi seu guia sair e voltar para seu corpo, na noite em que te ajudei, senti que você não estava aqui por acaso.


— Mas... Os espectros... O Padre?




— Com certeza não é obra do padre. Alguém os evocou para tentar pegar a pedra poderosa, o Olho do Diabo, que os cinco garimpeiros encontraram. Cinco garimpeiros, cinco espectros. Entendeu?


— E como você não virou zumbi? — Coloquei cera de abelha no ouvido. — Não foi o padre? — disse Benedito com o peito ensangüentado. — Então é bruxaria?


Nochay pensou na avó de Roy, sentada no banco da igreja. Você foi minha salvação. Agora, pego o ouro e a pedra, troco pela minha amada, Dos-Teh-Seh e fujo para Dallas. — o índio atirou a flecha bem no coração de Benedito, rompendo o cordão da guia.


Com a morte de Benedito seu Orixá foi definhando até sua luz apagar-se por completo. A bruma densa formou-se novamente. Os espectros muito feridos recolheram seus chapéus de mariachis e partiram juntamente com seus dragões. Um deles foi a pé. O do vermelho claro.


Nochay queria somente o ouro, a pedra poderosa daria a Cochise em troca da amada. De repente um mau cheiro veio com o vento. Rapidamente correu, escondendo-se atrás da porta. O fedor ficou mais forte e uma pessoa adentrou a antessala. Sem hesitar, Nochay acertou com sua machadinha a cabeça do homem que vinha passando. O corpo pesado caiu com a cabeça a sangrar.




— Desculpe xerife... Mas?!... É o Bob Rola Bosta?! O catador de estrume...




— Ora, ora, ora! Veja só se não é o apache maricas. Matou todo mundo pra ficar com o ouro da igreja? — disse Tedy, enquanto descia a escada. Apontava a arma para o índio. — Como ficou sabendo do ouro e do Olho do Diabo? Só eu o padre e o rola bosta aí, é que sabíamos de tudo. Agora não importa.




O cheiro nauseabundo enjoou Nochay.


— Impressionante como estes tampões de cera de abelhas funcionam contra estes seres infernais. O padre já havia me avisado do pressentimento ruim que teve, quando viu o forasteiro. E depois quando o vi lutando com os índios e os tiros dos irmãos Vanili, que não acertaram o homem. — foi dizendo Tedy. — Aí quando vi o negro deixar aquele espírito com os espectros e correr pra cá, e você vindo atrás, tudo fez sentido. Uma coisa me intriga, não consegui descobrir de onde vem essa bruxaria.


Nochay estava com a flecha apontada para o xerife. Verde de tão enjoado que estava, pelo hálito que vinha com o vento, começou a sentir tonturas.


— O que está acontecendo? — perguntou a velhinha surda por conveniência.


— Ela é a bruxa responsável pela maldição. — gritou Nochay na tentativa de distrair o xerife, mas a tontura forte fez tudo girarr.




— O quê? — perguntou a velhinha parando no alto da escada para retirar o tampão de cera de abelhas do ouvido e conferir se havia pisado no estrume.


Ao levantar a perna para olhar, desequilibrou-se caindo por cima de Tedy que disparou a arma acidentalmente, matando a velhinha. Pobre velha, só tinha ido rezar pela alma do neto. O xerife levantou e ao se virar para Nochay recebeu uma flechada certeira no peito, do índio que tombava desfalecido. Os dois caíram bem próximos, um ao lado do outro. Cabeça com cabeça. E último suspiro de Tedy, veio com palavras diretamente no nariz de Nochay.


— Eu... só... queria... — outro suspiro. — o poder do Olho do Diabo... para acabar com esse maldito... bafo...


Minutos mais tarde:


— Acho que nosso plano deu certo, Glória. Só foi um pouco antes da hora, graças ao forasteiro. — disse Gaynor enquanto descia a escada.




Nochay estava recobrando os sentidos e chamava por Dos-Teh-Seh. — O índio ainda está vivo. O que faremos com ele? — perguntou Glória — Ainda não chegou a vez dele.




— Ainda bem que aquele padre metido à exorcista se foi. Já estava dando nos nervos. Agora é só pegar o Olho do Diabo e dar o fora daqui.




— Que tal Eastwick, Glória? Mas vamos deixar a maldição aqui. Esta cidade merece. — Ótima idéia, Gaynor. Acho que lá Sobreviveremos melhor com todo o poder que o Olho do Diabo nos trará.




Glória assoviou, chamando o dragão vermelho claro, que agora assumira a cor rosa e totalmente purpurinado, apareceu, girando de braços abertos. As irmãs bruxas montaram no dorso do dragão e partiram.


— Eastwick ai vamos nós...


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