sexta-feira, 15 de julho de 2011

O Preço de uma Cagada

Este conto foi baseado em fatos reais vivenciados por um amigo. Alguns elementos foram inseridos ao conto para criar um clima mais tenso.



Boa leitura!




*****




— Pode tirar as calças, deitar de barriga pra cima e abrir as pernas... Nossa! Que assadura feia é essa? Você não usa cueca?
— Uso, mas sabe doutor, é uma longa história...
— Pode contar, você é meu último paciente mesmo.
— Então tá bom: Hoje seria um dia normal, como todos os outros. Acordei, tomei café, me troquei e fui trabalhar. Tive que fazer serviços lá no centro. Peguei o busão e fui. Até aí maravilha. Foi por volta das onze e meia que tudo começo.
Passei em frente a uma lanchonete, daquelas típicas do centro da cidade, suja, freqüentada por personagens estranhos, balconista com as unhas sujas, e salgadinhos que parecem estar na estufa há uma semana, mas mesmo assim, vi uma coisa que há tempos não via, bolovo.
— O senhor sabe o que é um bolovo, não sabe?
— Sim!
— O doutor teria coragem de comer um bolovo, numa lanchonete do centro, suja e mal cheirosa, onde o balconista tinha as unhas pretas de sujeira?
— Não!
— É, mas eu tive, e comi. Tá certo que não era o bolovo original, pois o bolovo original é só o ovo cozido, depois empanado e frito. O da lanchonete era metade de um ovo e carne moída, empanado e frito. Se eu fosse comparar um bolovo com alguma coisa, eu o compararia a uma granada de mão, acho que seria a comparação perfeita. O cara me serviu o bolovo e quando eu vi as unhas dele, franco que sou, falei: — O senhor podia pelo menos limpar estas unhas, não precisava nem cortá-las, mas pelo menos limpá-las.
— Você vai comer minhas unhas? — o balconista perguntou daquele jeito.
— Não! — respondi sem graça.
— E o bolinho você vai comer?
— Vou.
— Então não me encha o saco!
— Peguei o bolovo, sem pratinho mesmo, só no papel, que já estava transparente de tanta gordura e não falei nada. De repente meus olhos foram atraídos diretamente para uma barata que andava sobre o balcão. Eu olhava para ela e para o balconista ao mesmo tempo. Tive a impressão que ela olhava pra mim, querendo dizer alguma coisa, sei lá, do tipo — você tem certeza que vai comer este bolovo? Assustei-me com o murro que o balconista deu na barata sem olhar para ela, em seguida ele sorriu para mim mostrando os dentes. Foi aí que eu percebi que a sujeira não estava só nas unhas do balconista, mesmo assim, mordi o bolovo, só para relembrar os velhos tempos. Enquanto mastigava o pedaço do salgado via o homem limpar, com o pano de prato, os restos sobre o balcão, da agora amassada barata. Senti que o gosto do bolovo estava estranho, mas mesmo assim, dei outra mordida e mais outra. Enquanto mastigava lembrei que minha mãe toda vez reclamava ao meu pai, que a pia estava entupida.
— O bem! A pia entupiu outra vez. — dizia a minha mãe com aquela voz fina e irritante.
Meu pai saía do sofá e vinha reclamando até chegar na cozinha.
— Cacete mulher! Por que você tira esta merda de redinha do ralinho. Por isso que esta porra entope. Tem coca-cola?
— Tem.
— Então despeja no ralo que desentope.
— Bom. Pensei eu enquanto mastigava: Se a coca-cola desentope pia de cozinha, dissolve qualquer coisa no meu estômago. — Ai Brow, me vê uma coca, mas de garrafa de vidro.
— Caralho velho! Tu é fresco hein! Só tenho de lata. Vai querer ou não?
— Dá aí vai. Abri o refrigerante e bebi quase meia lata numa golada só. Puta merda, lembrei que outro dia passou no telejornal que, em hipótese alguma era para se colocar a boca diretamente na latinha de refrigerante, porque a quantidade de bactérias encontrada nela é assustadora. Já tinha ido. Terminei de comer o bolovo e de tomar a coca, pedi a conta.
— Seis paus! — o balconista disse.
Tirei uma nota de cinqüenta e dei para o balconista. Ele retirou o dedo indicador de dentro do ouvido, analisou o conteúdo retirado do interior do orifício auricular, incrível, com a mesma mão que ele usou para me dar o salgado, matar a barata e limpar a sujeira dos dentes e cutucar o ouvido, foi a que ele usou para pegar o dinheiro. Aquilo me embrulhou o estômago. Ele me devolveu o troco, coloquei o dinheiro no bolso da frente. E pensei: O que não mata engorda. E saí.
Tinha que ir até a Rua Líbero Badaró, no prédio da Prefeitura. No caminho algo estranho se moveu dentro da minha barriga. Nossa! Assim tão rápido? Deve ser só deslocamento de ar dentro das tripas. Entrei no prédio, peguei minha senha e fiquei esperando, estava lotado.
Outra vez senti aquele movimento nas entranhas da minha protuberância adiposa e desta vez fez barulho, pois uma senhora olhou pra mim. Apenas disfarcei. Aí veio outro. Sabe quando dá aquela vontade de peidar, só que em vez do peido sair ele volta, implode. Naquela altura do campeonato eu não podia peidar, não tinha confiança nenhuma no meu cu. Vai que em vez de vento vem merda. Achei melhor apertar com força. Veio outra torção. Acho que mais pessoas ouviram o barulho, pois olharam pra mim ao mesmo tempo. Comecei a suar frio e aquele rebuliço na barriga aumentou de intensidade. — Preciso achar um banheiro. As minhas mãos estavam molhadas de suor. Foi a porra do bolovo ou a merda da latinha? Ou os dois juntos? A coca-cola não foi tenho certeza. Não sei, só sei que eu saí procurando um banheiro. Pisei no pé da velha, chutei a bengala de um velho e depois o capacete de um motoboy.
— O campeão? — balançando o corpo para os lados, chamei o segurança que estava na entrada. — Onde tem um banheiro?
— Xiii, velho! O desse andar tá em manutenção, só três andares para cima. O elevador é ali.
— Valeu! Cheguei no elevador, apertei o botão e o cu ao mesmo tempo, quase caguei nas calças, foi por pouco. Acho que meu cu estava querendo armar uma cilada. O elevador não vinha, estava entrando em desespero. Comecei a fazer respiração cachorrinho e o suor escorrendo. Achei que iria funcionar, pois quando a mulher grávida vai dar a luz, em parto normal, funciona, e uma dor de barriga não pode ser pior que uma dor de parto. Será? Acho que é, pois a respiração cachorrinho de nada adiantou. Olhei para o lado e vi a escada de incêndio, estava em manutenção. — Cacete! Decidi, então, cronometrar o tempo entre uma torção intestinal e outra. Exatos um minuto e meio. — Ah! Será que da tempo de achar um banheiro em alguma lanchonete? Eu deveria voltar lá na lanchonete onde eu comi o maldito bolovo e cagar no banheiro dos caras, assim devolveria o bolovo e a coca, mas não daria tempo de chegar até lá. Saí do prédio da Prefeitura e caminhei. Ou errei na cronometragem ou a torção veio antes. Olhei no relógio, 45 segundos, fodeu. Nenhuma lanchonete a vista. A visão já estava ficando turva. — Puta que pariu, pensei, só faltava eu cagar em plena São Bento. Vi a entrada de um edifício, daqueles históricos ou melhor, pré-históricos. Olhei para cima e vi o nome do prédio, Edifício Plenitude. — Ah! Vai ser aqui mesmo. — Entrei, não vi ninguém na portaria, vai ver o porteiro foi ao banheiro dar uma cagada. Olhei para o outro lado e vi a porta que dava acesso à escada de incêndio. Entrei. Cacete e agora, subo ou desço, não sei por que, mas achei melhor descer. Foram três longos lances de escada. E puta merda, acho que nunca ninguém havia chegado ali. O cheiro de mofo era ruim. No meio do caminho outra torção. Não vai dar tempo! Pelo amor, como eu suava. Bem naquele lance a iluminação não funcionava. Tudo escuro. Mais uma torção e aquele barulho nas tripas.
Ah! Vou cagar aqui mesmo! Abaixei as calças e aí venho o dilema. Cago no degrau de cima ou no de baixo. Se cagar de costas para a escada, no degrau de cima, e for mole, vai escorrer e me sujar. Olhei os corrimãos, um de cada lado, vai ser virado para baixo. Segurei com as mãos no corrimão, aí quis inventar né, apoiei as pernas, uma de cada lado do corrimão. Fiquei, mais ou menos, na posição de mulher no ginecologista, com as pernas abertas no suporte. Assim evitaria qualquer possibilidade de me sujar nas próprias fezes. Já pensou se eu escorrego, caio e quebro o pescoço? Meu corpo caído com a cara enfiada na merda e o pescoço quebrado. Imaginei o CSI no caso. O senhor assiste CSI?
— Não dá tempo.
— Assista um dia, o doutor vai ver que legal que é. Enquanto eles vão observando o local dos acontecimentos vão imaginando as possíveis causas da morte. No meu caso a ajudante ia perguntar pro parceiro: — A cagada foi antes ou depois da morte? — Aí ela visualiza a cena mentalmente, eu pendurado no corrimão cagando. — Vou colher uma amostra para identificar a hora da cagada. — Depois ela passa aquele cotonete na merda e coloca dentro do saquinho zip e me vê escorregando e caindo. O barulho do estralo do meu pescoço quebrado encerra a cena. — Segurei com força. E aí então veio, veio que nem uma explosão. Acho que o Big Bang do universo deve ter sido uma bela de uma cagada, será que não?
— Não sei. Por que você acha?
— Ah! Sei lá, porque o mundo tá uma merda, acho que é por isso. Aí veio uma, duas, eu me agarrava ao corrimão com força, três, o suor descia e entrava no meu olho fazendo-o arder..
— Qual olho?
— O que eu enxergo né doutor. ...mas eu não podia limpar, não podia soltar as mãos do corrimão, outra torção, nessa acho que eu gemi, quarta vez. Ufa! Foi como se eu estivesse no espaço, flutuando. Estava aliviado. Um vento gelado bateu no meu cu e comecei a dar risadas...
— Por causa do vento no cu?
— Não, foi porque lembrei do nome do prédio, Edifício Plenitude. Era onde eu me encontrava naquela hora, na plenitude. A sensação era quase que “orgásmica”, Existe está palavra doutor?
— Não, você quis dizer orgástica.
— É, pode ser também. Esperei mais um pouco pra não ser pego de surpresa, torcendo para ninguém aparecer. Seria uma situação constrangedora. Saí da posição com muito cuidado, apesar do escuro, imaginei merda para todos os lados. E aí sim é que me vi em maus lençóis. Vou me limpar com o quê. — Engraçado essas coisas. Estamos com dor de barriga, sabemos que temos que nos limpar após a eliminação do bolo fecal, no meu caso acho que a consistência foi de suco, ou no máximo uma vitamina, e mesmo assim esquecemo-nos de levar algo para a devida limpeza da região. Pensei, vou esfregar a bunda no corrimão. Melhor não, vai que uma rebarba arranha o meu cu. Vai ser na meia então. Não detesto andar sem meia. Então vai ser com a cueca. Limpeza terminada, vesti minha calça e sai deixando para trás, minha cagada fétida e cremosa, junto com a cueca esmerdeada. Ah! Uma curiosidade, não sei se já aconteceu com o senhor, mas o cheiro da cagada era peculiar. Tinha cheiro de borracha. É sério. Outro dia meu sobrinho chegou em casa com uma bola de borracha e o cheiro era igualzinho. Por que será hein?. Para não levantar suspeitas, decidi subir três lances de escada, além do térreo, e descer de elevador. Sai do prédio e agradeci o porteiro, que agora estava lá. Mal sabia ele o que eu acabara de fazer lá na escada. Olhei para cima e li novamente o nome do prédio, Edifício Plenitude, suspirei aliviado e dirigi-me ao ponto de ônibus. — Quando fui pegar a grana, merda! Cadê o dinheiro. Só me faltava essa. Perdi o troco da lanchonete, quarenta e quatro reais. Vai ver, foi na hora que me pendurei no corrimão. Sem grana decidi voltar para casa na caminhada, não tenho cara de pau de pedir dinheiro na rua para os outros... Ué! Por que o senhor está rindo?
— Ah hahahahaha! Você entrou no prédio, cagou na escada de incêndio e depois diz que não tem cara de pau de pedir dinheiro? Ahahahahahaha!.
— Não sei qual é a graça, mas continuando. A pior coisa que existe acho que é usar calça jeans sem cueca. A costura grossa raspa na coxa pelo lado de dentro, perto da virilha e embaixo do saco. Aquilo vai te assando, assando, até ficar em carne viva. E andar do centro até minha casa só podia dar nisso, como o senhor pode verificar.
— Ô? Tá rido de novo por quê?
— Não, sabe que é?... estou fazendo as contas de quanto custou essa cagada.
— Aeee tá me tirando?
— Não! É sério, quer ver só? R$ 6,00 do salgado e o refrigerante... A cueca era nova?
— Mais ou menos, estava esgarçando no fundilho e o elástico estava folgado.
— Uma cueca boa custa R$ 27,00, mais ou menos, no seu caso ela valia uns R$ 10,00, R$ 44,00 que você perdeu, R$ 25,00 da pomada que vou te receitar, R$ 3,00 do pacotinho da gaze. Qual é o seu salário?
— 700, por quê?
— 700 divididos por trinta da 23.333333... dividido por 2, vai dar 11,66666..., vamos arredondar para R$ 12,00, que é meio dia de trabalho perdido. Pa,papapapapa... deu R$ 100,00..... hahahahahaha!
— O que é R$ 100,00?
— O preço da sua cagada hahahahaha. Sua sorte é que aqui é hospital público se não... hahahahaha.


Acho que ela também comeu um bolovo antes da entrevista



Corre procurar uma escada de incêndio...

3 comentários:

  1. kkk
    "Vou colher uma amostra para identificar a hora da cagada"

    Puta que pariu! Eu vou ter que contar.
    Outro dia estava enjoada e para me distrair resolvi ler esse conto ¬¬... Só na cena do bolovo eu quase coloquei tudo pra fora.


    Bom, o que importa é que voltei aqui pra ler.
    Adorei. Muito divertido! Dei risada sozinha.
    É muito nojento, muito real. Incrível.
    Gostei mesmo.

    Bju

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  2. kkkkkkk!!!!!!!!
    Ai Gerson, só tu mesmo! rsrsrs

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  3. A explicação científica acerca da formação da assadura foi massa! Cara, quase que eu me borrava de rir!

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